Flavio Brayner
Professor Titular da UFPE
Ninguém,
em sã consciência e boa fé, defenderia uma instituição mal gerida,
desperdiçando recursos financeiros e humanos, deixando de prestar os serviços a
que se destina, sem oferecer as condições mínimas de funcionamento,
burocratizada e intransparente. O problema não se situa na defesa de uma
administração eficiente e eficaz: está em considerar as instituições como um
“problema de gestão”.
O pano de fundo do “processamento” ou gestionarismo é o de que
existe um método “universal” aplicável aos casos particulares, e todo caso
particular pode ser enquadrado nesse universal, não importando se se trata de coisas ou pessoas, todos compreendidos como “insumos” ou “produtos” e, assim,
nada deve escapar ao olho vigilante da gestão, que “prevê para prover” (divisa
positivista): estamos no Reino da Equivalência Geral! Que engenheiros, médicos,
auditores do tribunal de contas ou economistas possam se tornar administradores
de sistemas públicos de ensino, por exemplo, sem jamais terem lido uma única
linha sobre educação, isto deixou de ser um problema. Aliás, o problema está em
deixar educadores gerirem a educação! Educadores “banhados em ideologias
ultrapassadas e engessadas”, mais tendentes a seguir “éticas de convicção” do
que de “responsabilidade” (M. Weber) e, claro, produzindo “resultados” pífios.
O gestionarismo, como ideologia do social administrável, é a
forma de impedir a emergência do imprevisível, da imaginação social instituinte
e, por fim, uma forma de bloquear a novidade histórica. Aqui é necessário não
confundir a “inovação” (em geral
restrita à tecnologia e à gestão, característica da modernização reacionária e
da sociedade do consumo imediato) com o “novo”
(o não pensado, o insólito, o inaudito), o que significa dizer que aliar quebra
de paradigma e gestionarismo representa uma... contraditio in termini.
Tratando tudo como problema de gestão, onde todos os sistemas se
equivalem porque podem ser administrados segundo uma Razão Gestionária Universal, é a diversidade, a pluralidade (de
culturas, de ideias, de visões, de concepções de vida) que se vê submetida ao
Império do Mesmo. O gestionarismo é o
nome do medo que temos da emergência do diferente, do inaudito, do inesperado.
É a solução técnica para conter a ameaça da incerteza que toda democracia
comporta.
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